Resumo: Esta tese aborda as comédias do escritor espanhol Lope de Vega a partir da forma como foram impressas no século XVII. O objetivo central do trabalho é analisar os modelos de feminino bobo, rústico e engenhoso em El Animal de Ungria e La Dama Boba, peças presentes no primeiro cânone editorial de doze comédias em fólio organizado por Lope de Vega. Tal edição, nomeada por ele como Novena Parte, foi impressa por Francisca de Medina em 1617. Lope afirma ser essa a primeira docena impressa sob seu controle das que já circulavam com seu nome, a partir da qual daria continuidade à impressão de suas comédias em docenas. Utilizamos tais edições impressas entre 1617 e 1625 como meios de verificação das convenções materiais, estilísticas e temáticas das comédias de Lope de Vega, analisando seus paratextos para cotejar parâmetros de costumes letrados sobre o que confere função, decoro e excelência para as comédias de Lope, aos seus próprios olhos e dos censores de sua época. Estabelecemos similaridades com o padrão editorial das seis comédias de Terêncio impressas na Madri de 1599. Tal material é usado como base comparativa em relação à preceptiva sobre a escrita dramática de Lope contida em Arte Nuevo de hacer comedias en este tiempo, cuja versão mais antiga está localizada na edição lusitana de Rimas (1605). O método da pesquisa nos permite criar uma perspectiva histórica específica sobre os recorrentes modelos de relevância moral, política e poética na forma de conceber e sequenciar temas para as comédias na Novena Parte, configuração editorial que propõe percursos de legibilidade que desaparecem nas edições críticas contemporâneas, já impregnadas por outras agendas críticas de modernidade. É dentro desse quadro de localização histórica, genética e temática que pretendemos examinar como as comédias de Lope prescrevem decoros morais e políticos dirigidos à aristocracia no caso dos enredos contidos na Novena Parte. A hipótese principal é de que a Novena Parte segue o modelo terenciano de comédias centrado em assuntos de rei familiaris, embora haja uma cisão com relação a esse modelo somente na peça El Animal de Ungria, mais focada em assuntos de res publica, formando um antítipo temático em relação à peça La Dama Boba. Propõe-se, sobre El Animal de Ungria, que os temas cômicos da rústica e da soberana oculta (uma farsa, portanto) são enredados para transformar um espelho de costume (i.e., a comédia) num espelho de príncipe dramatizado com potencial subjacente de tragédia.

Palavras-chave: Vega, Lope de, 1562-1635; Vega, Lope de, 1562-1635. Comedias - Novena parte; Terêncio, 185-159 a.C.; Comédia; Feminino