Resumo: Com a homologação da Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2018), surge a necessidade de adequação curricular pelos estados com vistas a atender essa normativa federal. O estado de São Paulo, que já tinha uma base comum de conteúdos, habilidades e competências, reformula seu currículo para o ensino fundamental e educação infantil, lançando em julho de 2019, o Currículo Paulista (SÃO PAULO, 2019a). Nesse cenário, este trabalho objetiva descrever e analisar como a SEDUC-SP se apropria da BNCC (BRASIL, 2018) no que diz respeito aos pressupostos teórico-metodológicos do componente curricular de LP nos anos finais do Ensino Fundamental, tanto no âmbito do currículo prescrito quanto no do currículo apresentado ao professor, em relação a concepção, seleção e tratamento dos gêneros discursivos e dos novos e multiletramentos. Para tanto, os pilares teóricos alicerçam-se na perspectiva dos estudos bakhtinianos da linguagem (BAKHTIN, 2003 [1992]; BAKHTIN; VOLOCHÍNOV, 2014 [1929]), dos estudos dos novos (LANKSHEAR; KNOBEL, 2012) e multiletramentos (THE NEW LONDON GROUP, 1996; 2006 [2000]), de um lado, e, de outro, nos estudos curriculares, em especial da concepção de currículo (LOPES; MACEDO, 2011; SILVA, 2016), dos níveis de concretização (SACRISTÁN, 2000) e da organização curricular (LOPES, 2008; LOPES; MACEDO, 2011). A articulação entre os estudos sobre ensino e aprendizagem da Língua Portuguesa e os de currículo são essenciais para a compreensão macro do currículo de Língua Portuguesa nos anos finais do Ensino Fundamental da rede paulista, visto que o corpus desta pesquisa é composto pelo Currículo Paulista (SÃO PAULO, 2019a) e pelos cadernos do aluno e do professor nomeados Currículo em Ação 9º Ano Ensino Fundamental II (SÃO PAULO, 2021a, 2021b, 2021c, 2021d), consideradas as Situações de Aprendizagem dos dois primeiros volumes do ano em de 2021. Ancorado no quadro de pesquisas qualitativas (MOITA LOPES, 1994) na área de Linguística Aplicada (PENNYCOOK, 1998; RAJAGOPALAN, 2003), o trajeto metodológico dá-se da investigação documental (LANKSHEAR; KNOBEL, 2008; LÜDKE; ANDRÉ, 2018) à análise dialógica (BAKHTIN; VOLÓCHINOV, 2014; BRAIT, 2006) e ao cotejo de textos (BAKHTIN, 2003 [1992]; GERALDI, 2012), tendo em vista que a materialidade linguístico-semiótica é ancorada socialmente, a partir das relações dialógicas estabelecidas no elo da cadeia de comunicação humana (BAKHTIN, 2003 [1992]; BAKHTIN; VOLOCHÍNOV, 2014 [1929]). Os resultados da análise do Currículo Paulista (SÃO PAULO, 2019a) evidenciam não haver no documento paulista a consideração de uma parte diversificada. Nesse sentido, as habilidades da BNCC, quando alteradas, são apenas desmembradas, sem alterações ou acréscimos significativos, sendo que a organização proposta pelo documento tira o foco do campo como organizador das habilidades. Já os resultados da análise das situações de aprendizagem, nos Cadernos Currículo em Ação (SÃO PAULO, 2021a, 2021b, 2021c, 2021d), mostram que as práticas privilegiadas são a leitura e análise linguística/semiótica, relegando à oralidade um espaço pífio na constituição das atividades. Em relação à produção de texto, parte significativa das atividades não apresentam contexto de produção para que os estudantes possam produzir seus textos de modo contextualizado. Já em relação aos letramentos considerados, os novos letramentos só são observados em sugestões genéricas aos professores. Quanto aos multiletramentos, as situações de aprendizagem também não exploram os diferentes modos de significação, mantendo a discussão no nível do verbal e não verbal, e os gêneros considerados não são efetivamente trabalhados, mas apenas mencionados nas propostas de produção. Por fim, os dados evidenciam inconsistências entre o nível do currículo prescrito e o do currículo apresentado ao professor nas produções da SEDUC-SP.

Palavras-chave: Língua portuguesa - Estudo e ensino; Multiletramentos; Ensino fundamental - Currículos; Currículos; São Paulo (Estado)