Resumo: O presente trabalho tem como objetivo refletir sobre as Geórgicas (ca. 37-30/29 a.C.) de Virgílio pela perpectiva da cenografia discursiva. O ponto de partida é um contraponto com a pesquisa filológica tradicional, predominante em Estudos Clássicos e que, em linhas gerais, considera o texto literário como uma instância majoritariamente entendida à luz de um sistema literário. De modo contrário, um texto, ainda que um poema antigo, pode ser entendido como uma instância aberta a outros sistemas, por exemplo, o cultural, o social, o político etc. A presente pesquisa considera o discurso não sob seu aspecto retórico ou ideológico, mas enquanto uma “dipsersão” de textos (de múltiplos sistemas) que deixa transparecer seus modos de “inscrição”. O poema virgiliano, assim, é submetido à noção de cenografia discursiva de Dominique Maingueneau. A metáfora teatral, numa linha de abordagem pragmática, oferece um espaço instituído. Três são as “cenas” envolvidas, a saber, a cena englobante, a cena genérica e a cenografia. À guisa de exemplo, passagens do livro 4 das Geórgicas são exploradas; nesse livro, reconhecem-se uma proposição temática, a apicultura (cena englobante), um gênero discursivo, a linguagem de preceitos (cena genérica) e um modo de representação particular, a poesia hexamétrica, de tradição homérica e hesódica (cenografia). As três “cenas” formam o cenário de enunciação do quarto livro das Geórgicas. É, no entanto, como uma cenografia – a “cena” mais proeminente – que o livro encena seu aparecimento, é nela que a recepção é supreendida pelo modo particular de expressão do livro.

Palavras-chave: Virgílio. Georgicas - Crítica e interpretação; Análise do discurso; Gêneros discursivos; Teatro e linguagem; Metáfora.