João Sarmento Pimentel
1888-1987


TÁBUA BIOGRÁFICA

1888 - Nasce a 14 de dezembro.
1912 - É promovido a alferes de Cavalaria, a 15 de novembro, depois de ter cursado a Escola do Exército.
1915 - Toma parte nas campanhas do Sul de Angola, e comanda uma força que recupera o posto de Naulila, abandonado no ano anterior.
1918 - É promovido a Capitão.
1919 - Durante o movimento militar que proclama a Monarquia no Porto, põe-se à frente das forças fiéis que restauram a República naquela cidade, após uma rápida e enérgica luta.
1921 - Torna-se membro da direção da revista Seara Nova.
1927 - Após participar do movimento de fevereiro contra o Estado Novo salazarista, instalado no ano anterior, é demitido e exila-se no Brasil, fixando-se em São Paulo.
1963 - Edição brasileira da Primeira Parte das Memórias do Capitão.
1974 - Edição portuguesa completa das Memórias do Capitão. Regressa a Portugal.
1987 - Falece em Lisboa.



   [...]
   Dali passei a Santo Tirso, onde estive homiziado numa quinta toda murada como grande cerca de convento. Uma semana depois fui para a Torre, a velha casa de quando eu era moço e feliz. Só dois dias, e uma antiga criada apavorada, pois a Polícia já lá tinha estado e vasculhara tudo, até os gavetões do arcaz da sacristia da Capela. Portas e janelas fechados para que ninguém suspeitsse que alguém dos donos estava ali, era como alma penada a passear pelos salões, quartos, corredor e na varanda à noite, no escuro, ouvindo a água das taças do jardim a chorarem baixinho as mágoas da minha desventura.
   E os mortos vinham-me à lembrança, também assistiam aquele drama e contavam os desenganos, os sofrimentos, os triunfos por que passaram, pareciam sentados naquelas cadeiras, dormindo nas amplas cadeiras de espaldar, passeando pelas ruas do jardim, as velhas matronas colhendo flores para a capela, onde a Nossa Senhora das Dores, com o filho morto no colo, chorava da injustiça e da crueldade dos homens. Outras vezes aquelas roseiras que vinham até a varanda deram as rosinhas de toucar para enfeitarem o caixão dum pequenito e que a pobre mãe pedia por esmola, lágrimas nos olhos tristes e saudosos, dizendo, entre soluços duma mágoa que só as mães trazem estampadas no rosto quando perdem um filho, que o seu anjinho, assim enfeitado e todo de branco iria para o céu mais contente, e era até uma Graça do Senhor tê-lo levado, pois já não passava mais fome nem frio, como os outros irmãos, que ficaram neste mundo dos "probes".
   [...]

JOÃO SARMENTO PIMENTEL, Memórias do Capitão.



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